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Conclave: ação de toda a Igreja

“Durante a Sé vacante, e sobretudo no período em que se realiza a eleição do Sucessor de Pedro, a Igreja está unida, de modo muito particular, com os pastores sagrados e especialmente com os Cardeais eleitores do Sumo Pontífice, e implora de Deus o novo Papa como dom da sua bondade e providência."

Luís Eugênio Sanábio e Souza –  escritor de Juiz de Fora (MG) -  BRASIL

O Magistério da Igreja nos explica que o Conclave, isto é, a reunião que irá eleger o novo Papa, é uma ação de toda a Igreja e, portanto, não é um fato isolado reservado apenas aos cardeais eleitores.  Sobre isso, São João Paulo II explicou assim: “Durante a Sé vacante, e sobretudo no período em que se realiza a eleição do Sucessor de Pedro, a Igreja está unida, de modo muito particular, com os pastores sagrados e especialmente com os Cardeais eleitores do Sumo Pontífice, e implora de Deus o novo Papa como dom da sua bondade e providência.  Com efeito, seguindo o exemplo da primeira comunidade cristã, de que se fala nos Atos dos Apóstolos (At 1,14), a Igreja universal, unida espiritualmente com Maria, Mãe de Jesus, deve perseverar unanimemente na oração;  deste modo, a eleição do novo Pontífice não será um fato separado do Povo de Deus e reservado apenas ao Colégio dos eleitores, mas, em certo sentido, uma ação de toda a Igreja”  (São João Paulo II,  Constituição Apostólica UNIVERSI DOMINICI GREGIS nº 84).

Portanto, todos devem participar do Conclave através de orações para que Deus ilumine os cardeais eleitores.   Podemos então compreender o aspecto transcendente de um Conclave.  O Conclave não é uma disputa política de poder entre os cardeais.  O Conclave é uma celebração religiosa em que, mediante orações, se busca ouvir aquilo que o Espírito Santo quer indicar para a Igreja.   Um Conclave sintetiza bem o mistério da união entre os dois elementos que formam a Igreja, isto é, o elemento humano e o elemento divino.  O Concílio Vaticano II nos lembra que “a Igreja terrestre e a Igreja ornada com os dons celestes não se devem considerar como duas coisas, mas como uma única realidade complexa, formada pelo duplo elemento humano e divino” 1.      

A forma de eleição de um Papa variou ao longo dos séculos de acordo com as circunstâncias históricas, mas, como diz o Concílio, “subjacentes a todas as transformações, há muitas coisas que não mudam, cujo último fundamento é Cristo, o mesmo ontem, hoje, e para sempre” 2 .  Neste sentido, nunca deixou de existir a oração de invocação da assistência do Espírito Santo para este importantíssimo momento de eleição daquele que será o legítimo Sucessor do Apóstolo Pedro a quem Jesus Cristo confiou o governo da Igreja (Mateus 16,18-20).   Assim, é prevista a oração cantada no hino “Veni Creator Spiritus” (“Vem Espírito Criador”)  por ocasião da presença dos cardeais na Capela Sistina onde ocorrerá o Conclave.  Portanto, é importante não perdermos de vista este aspecto transcendente do Conclave que se reflete nas orações, nos cantos, nos gestos e nos juramentos. 

Afinal, quem será o novo Papa ?  Não temos a presciência e diante de Deus devemos reconhecer humildemente o “quanto são insondáveis os seus desígnios e imperscrutáveis as suas vias” (Romanos 11, 33).   É natural que cada um tenha um nome em mente e que julga ser mais apto para ocupar a Cátedra de Pedro;  mas devemos lembrar daquela passagem da oração que Jesus nos ensinou :  “seja feita a vossa vontade assim na terra como no Céu”.  Afinal, de acordo com a fé, deve prevalecer aquela máxima do Conclave que diz: “os cardeais elegeram, mas foi Deus que escolheu” !   Sabemos que Deus não escolhe homens perfeitos para o papado, porque “todos os membros da Igreja, inclusive seus ministros, devem reconhecer-se pecadores” (Catecismo da Igreja Católica nº 827 citando 1 Jo1,8-10).  Quando foi eleito Papa, Bento XVI assim disse: “Consola-me saber que o Senhor sabe trabalhar e agir também com instrumentos insuficientes. E, sobretudo, recomendo-me às vossas orações” (Primeira saudação de Bento XVI em 19/04/2005).  O Magistério da Igreja reconhece que “na história do Papado não faltaram erros humanos e defeitos também graves:  o próprio Pedro, com efeito, reconhecia ser pecador (Lucas 5,8).  Pedro, homem frágil, foi eleito como rocha, precisamente para que fosse evidente que a vitória é só de Cristo e não resultado das forças humanas. O Senhor quer levar em vasos frágeis (2 Cor 4,7) o próprio tesouro através dos tempos: deste modo a fragilidade humana tornou-se sinal da verdade das promessas divinas” (Congregação para a Doutrina da Fé : “O Primado do Sucessor de Pedro no mistério da Igreja” nº 15). 
Algumas pessoas, indevidamente apoiadas em critérios políticos e não religiosos, desejam para o futuro um Papa mais “progressista”, enquanto outros, ao contrário, desejam um papa mais “conservador”.   Mas tais classificações (progressista ou conservador) são incorretas porque são reducionistas e consequentemente foram sempre rejeitadas pela Igreja.  Neste sentido, certa vez vez o Papa Francisco disse que “tudo na Igreja deve conformar-se com as exigências do anúncio do Evangelho; não com as opiniões dos conservadores ou dos progressistas, mas com o fato de que Jesus alcance a vida das pessoas”;  “É muito triste ver a Igreja como se fosse um parlamento;  não, a Igreja é outra coisa.  A Igreja é a comunidade de homens e mulheres que acreditam e anunciam Jesus Cristo mas movidos pelo Espírito Santo, não pelas próprias razões.  Sim, usa-se a razão mas vem o Espírito que a ilumina e move. O Espírito faz-nos sair, impele-nos a anunciar a fé, impele-nos para nos confirmarmos na fé, a ir em missão para reencontrarmos quem somos.  Por isso, o Apóstolo Paulo recomenda assim: “Não extingais o Espírito!” (1 Ts 5, 19), não extingais o Espírito” 3.

Ainda segundo Francisco, “lida com as categorias de conflito (direita e esquerda, progressista e tradicionalista), a Igreja divide-se, polariza-se, perverte-se e atraiçoa a sua verdadeira natureza: é um Corpo perenemente em crise, precisamente porque está vivo, mas não deve tornar-se jamais um Corpo em conflito com vencedores e vencidos, pois deste modo semeará temor, tornar-se-á mais rígida, menos sinodal, e imporá uma lógica uniforme e uniformizadora, muito distante da riqueza e pluralidade que o Espírito deu à sua Igreja” 4.

O próximo Papa estará comprometido é com o Evangelho e, dentro de um normal processo de desenvolvimento doutrinal, será sempre fiel à Tradição Apostólica, pois, como foi dito acima, Jesus Cristo é o mesmo ontem, hoje e sempre (Hebreus 13,8).  Por isso, não existe progresso sem tradição e a tradição não impede o progresso. A Igreja não é estática, mas dinâmica.  O compromisso da Igreja não está em seguir a mentalidade mundana, tantas vezes perversa, mas sim em proclamar a imutável Palavra de Deus de maneira renovada de acordo com as novas circunstâncias.  O Apóstolo Paulo adverte : “Não vos conformeis com este mundo, mas reformai-vos com o renovamento do vosso espírito, para que reconheçais qual é a vontade de Deus, boa, agradável e perfeita” (Romanos 12,1-3).

Por fim, desejo recordar aqui as seguintes palavras do Concílio Vaticano II : “Caracteriza-se a Igreja por ser humana e ao mesmo tempo divina, visível, mas ornada de dons invisíveis, operosa na ação e devotada à contemplação, presente no mundo e, no entanto, peregrina.  E isso de modo que nela o humano se ordene ao divino e a ele se subordine, o visível ao invisível, a ação à contemplação e o presente à cidade futura, que buscamos” 5

 

NOTAS

1 -  Concílio Vaticano II:  Constituição Dogmática Lumen gentium nº 8 .

2 -  Concílio Vaticano II :  Constituição Pastoral Gaudium et spes nº 10 .

3 -  Papa Francisco :  Audiência Geral em 22/02/2023.

4 -  Papa Francisco :  Discurso à Cúria Romana para as felicitações de Natal em 21/12/2020

5 -  Concílio Vaticano II :  Constituição Sacrosanctum Concilium nº 2

 

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30 abril 2025, 08:37